27 de novembro de 2008

O esporte mudou?

Alguns processos levam tempo, vão acontecendo aos poucos sem quase ninguém perceber e de repente já fazem parte do nosso dia-a-dia. Nesse momento acontece alguma coisa que simboliza este novo cenário e todos, a partir de então, lembram-se: “Desde aquele fato as coisas mudaram...”
O Mundial da Malásia pode ser um desses marcos. Maria Ponton fez a prova inteira na frente, variando o ritmo o tempo todo (20, 18, 19, 16, 18, 17 e 21 foram suas médias por anel) e sagrou-se campeã do mundo. Mais do que investir numa estratégia diferente do padrão europeu (até então vencedor absoluto em mundiais), Maria virou as costas para uma “pressão social” (européia) que rotulava de “sem cabeça”, “despreparado” e “tolo que não entende o esporte e o ritmo do cavalo” aqueles que não faziam os primeiros anéis devagar para (tentar) recuperar nos últimos.

Será que ela fez isso porque monta nos Emirados, onde todas as provas são ganhas assim? Ou por influência dos treinadores uruguaios que tem na equipe? Será que essa estratégia sempre foi potencialmente vencedora ou só em determinados locais é vantajosa? Se a prova tivesse 6 anéis com descansos mais curtos e uma última etapa mais longa, a história seria a mesma? Nas velocidades nas quais são corridas as provas hoje em dia, é mesmo vantagem ter um cavalo inteiro e 15 minutos (ou mais) de desvantagem no último anel?

Enfim, o esporte mudou ou só se constatou que em condições diferentes das européias nem sempre a estratégia crescente é indiscutivelmente a melhor?

Em qualquer um dos casos, nós, brasileiros, podemos parar de nos culpar por nunca ter conseguido ser tão estrategicamente disciplinados e conscientes como franceses, espanhóis, italianos, etc.

1 de setembro de 2008

Quase

Às vezes a gente quase ganha. E assim foi Compiègne pra mim. No primeiro anel cheguei em 11º e fui o primeiro a entrar no vet. No segundo anel, fui o sétimo a chegar e o primeiro a entrar. No terceiro anel a história se repetiu: cheguei no bolo da frente e entrei em primeiro lugar no vet-check. Largaria em primeiro para o último anel, com o cavalo inteiro e cheio vontade de andar, mas aí ele mancou.

Mancou, aparentemente, graças a um corte relativamente profundo no bulbo da mão esquerda, resultado da alta velocidade e curvas rápidas no barro no qual virou a trilha depois de tantas horas de chuva. Na verdade, pouco importa o motivo da eliminação. O que importa é a mensagem que ficou depois do balde de água gelada que te leva de “Campeão do Mundo” a “Nada” (ou pior, a “Quase-Alguma-Coisa”): O Brasil tem tudo pra ganhar de qualquer um, só precisa tentar.

7 de julho de 2008

Estatísticas do primeiro semestre

Assim como foi feito no começo do ano em relação a 2007, atualizo aqui as estatísticas das 5 provas de longa distância realizadas no primeiro semestre deste ano.

Número de inscrições:

Este primeiro semestre foi impressionantemente pobre em inscrições. Ao todo, foram 85, distribuídas em 13 provas e 5 eventos (lembrando: cada categoria conta como uma prova, e todas juntas como um evento). Ou seja, em média cada prova (leia-se categoria) contou com apenas 6,5 inscritos. É a pior média desde que se acompanha este número (até então 2005 com 9,5 era o pior ano e 2002 com 16,3 o melhor). Como este foi o período com mais provas por evento, graças às 3 provas de 160kms, a média de inscrições por evento não é tão ruim: 17,0 – o que ainda é o pior período, atrás de 2000 com 19,6. O melhor foi 2002 com 36,8.

Se considerarmos que o Campeonato Brasileiro e a Haras Endurance, que normalmente são as provas com mais inscritos no ano, já aconteceram, as perspectivas não são boas. No entanto, acredito que o Jequitibá Open e o Campeonato Paulista contarão com inscrições suficientes para aumentar esta média.

Velocidade:

Em relação à velocidade o semestre apresenta duas perspectivas diferentes. Nos 120kms o semestre foi fraco: a prova mais rápida foi ganha a 17,34kms/h, velocidade que não foi alcançada apenas em 2002, 2001 e 2000. A média de velocidade nesta distância foi de apenas 14,72kms/h, índice superior apenas ao de 2000. Já nas provas de 160kms, a mais rápida foi ganha a 16,84kms/h, perdendo apenas para 2006, que contou com a atípica prova de Campinas. Na média de velocidade, fez-se 15,92kms/h, o que condiz com as velocidades de 2007 e 2006.

Preço de inscrições:

Neste quesito houve uma sensível diminuição de preço médio neste semestre. A média caiu de R$ 591,58 (2007) para R$ 541,15 (1º semestre 2008), aproximadamente 9% menos em termos nominais, que seria majorado caso corrigíssemos o preço do ano passado pela inflação.

Pedigree:

Neste semestre, graças ao baixo número de inscrições, diminuí o número mínimo de inscrições para que uma prova valesse pontos, de 10 para 5. Assim, o ranking de garanhões, que pontua as 5 gerações de cada cavalo, ficou deste modo (contando apenas as 5 provas deste ano):

1º - Bask

2º - Aladdinn

3º - Witraz

4º - Morafic

5º - Persik

O ranking de pais (no qual pontuam apenas os pais dos cavalos) ficou da seguinte maneira:

1º - Persik

2º - Aicyng Ahra

3º - Pepi

4º - Expoente

5º - Ninjah El Jamaal

É interessante destacar a presença de Persik nos dois rankings, por se tratar de um cavalo estrangeiro com pouquíssimos filhos no Brasil. Não que seja surpresa, dada sua importância e reconhecida qualidade no esporte.

24 de junho de 2008

Só uma idéia

29/03/08 – Rancho Canabrava – 120kms:
Adulto – 5 conjuntos
Young Riders – 2 conjuntos

05/04/08 – Paraopeba – 120kms:
Adulto – 3 conjuntos
Young Riders – 2 conjuntos

19/04/08 – Haras Endurance – 120kms:
Adulto – 7 conjuntos
Young Riders – 7 conjuntos

07/06/08 – Campeonato Brasileiro – 120kms:
Adulto – 9 conjuntos
Young Riders – 10 conjuntos

Eu não sei qual o motivo deste baixo número de inscrições este ano, talvez no Brasileiro e no Haras Endurance tenha um pouco a ver com a prova de 160kms que ocorreu junto com a de 120kms. Mas, de qualquer maneira, não seria melhor ter tido provas com categoria única, com 7, 5, 14 e 19 concorrentes, respectivamente?

Acredito que todos os conjuntos se beneficiariam de correr contra mais concorrentes, tanto como forma de aprendizado quanto como participação em uma prova mais importante e competitiva. Afinal, isto é a essência de um esporte.

Numa prova de categoria única – e, portanto, com mais concorrentes – a vitória e cada posição valorizam-se, dando um outro status à prova e aos seus competidores. Além disso, ganha-se experiência fundamental para correr mundiais e outras provas internacionais nas quais largam mais de 100 competidores juntos.

Se nossas provas contassem com apenas uma categoria, nosso esporte ganharia muito. O maior exemplo disso era o Jequitibá Open quando não tinha uma prova de Young Riders um dia antes da prova de categoria única: na época era a mais competitiva e uma das mais esperadas do calendário. Suas chegadas, inclusive, ilustraram o quanto o esporte ganhava com este tipo de prova: num ano chegaram disputando Thayza Malouf e Mariana Cesarino; no outro Leco Razuck e Patricia Taliberti; e no último Lilian Garrubo e Ana Carla Maciel – todas disputas entre um adulto e um Young Rider que numa prova “normal” chegariam tranquilamente ao passo.

9 de junho de 2008

Uma exceção

Quando iniciei este blog minha proposta era não ficar dando parabéns e afins. Não porque as pessoas não mereçam, mas porque disto o ForumEnduro já está cheio e porque o blog seria um espaço para opinião.

No entanto, abro aqui uma exceção. Queria parabenizar todo o pessoal do Rio Grande do Sul que viajou mais de 2000 kilometros com um cavalo diferente de todos os outros presentes, correram para ganhar, protagonizaram o Campeonato Brasileiro de 120kms e foram vice-campeões brasileiros. Parabéns! É sempre muito legal ver pessoas de regiões diferentes e com cavalos diferentes começando no esporte e fazendo as coisas de maneira certa.

Parabéns também a todos os demais enduristas, que, apesar de uma compreensível descrença inicial, claramente torceram para o cavalo crioulo, saudaram o conjunto após a prova e se alegraram com o resultado. O enduro equestre brasileiro ganhou muito com a atitude de todos.

12 de maio de 2008

O que é que o Brasil tem?

“Um dia o Brasil será campeão do mundo”. A frase é de Pio Olascoaga, do Uruguai, que depois de certa hesitação de minha parte completou “vocês tem ótimos cavalos, cavaleiros jovens que já rodaram o mundo ganhando experiência e têm dinheiro”.

É verdade. Acredito que o Brasil seja o país com mais garanhões franceses fora da França (além de uns 4 ou 5 Persiks, há o Uzbek, filho de Dormane, e o Saad, que já tem um filho campeão francês de 160 e cuja filha foi vice-campeã francesa de 120kms sábado passado). Além disso, temos a 2ª maior tropa de árabes do mundo – algo de bom deve ter aí no meio – e ainda importamos sêmen.

Temos cavaleiros jovens e dedicados que já são experientes. Corremos todos os campeonatos mundiais de Young Riders, tivemos equipes de jovens nos dois últimos panamericanos e não é incomum ouvir notícias de cavaleiros brasileiros que participaram de provas no exterior.

Temos dinheiro. O que passa despercebido por muita gente é importante: em outros países, por melhor que seja um conjunto ele não irá a um mundial. Ou porque uma oferta de US$ 50.000,00 em seu cavalo representa um dinheiro muito importante para ele ou porque ele não terá dinheiro para a viagem.

Além destes pontos elencados por Pio, acrescento que temos provas muito bem organizadas e suficientemente competitivas (este último ponto mais no 120kms do que no 160kms).

A única coisa que o Brasil não tem são cavaleiros que vivam com seus cavalos. Na Europa os cavaleiros de ponta vivem e montam seus cavalos todos os dias. Me lembro que quando fui ao Uruguai me surpreendi quando Juan Miguel notou que um de seus cavalos estava comendo de modo mais afobado do que o normal: eu nem fazia idéia de como os meus comiam. Todo esse conhecimento conta pontos para tirarmos mais do cavalo durante uma prova e para sentirmos quando podemos tentar fazê-lo e quando não é o dia.

Como já vi um Sheikh ser campeão do mundo (mesmo investindo milhões) e um uruguaio ganhar Compiègne com um cavalo que nunca tinha visto na vida (mesmo ele vivendo, almoçando, jantando e dormindo com cavalos), não posso discordar do Pio.

28 de abril de 2008

Mais que uma prova

Com 6 anos fiz minha primeira prova de enduro e logo depois comecei a montar na hípica. Aos 15 tive que escolher entre salto e enduro, já que era impossível levar ambos a sério. Uma das razões que me fez abrir mão do salto foi o fato de que no enduro eu teria muito mais chances de participar de um mundial do que no salto.

É mais ou menos esse o pensamento da maioria dos enduristas: tudo pelo mundial. Todos se lembram de como cada diretor da CBH definiu a seletiva para os mundiais, embora poucos saibam dizer o que mais cada um que passou pelo cargo fez. Todo mundo sabe quem são os cavalos aptos a participarem do mundial da Malásia, mas é difícil elencar os favoritos a ganhar o Campeonato Brasileiro. O mais comum nas entrevistas com enduristas é escutar que o seu sonho é participar, ser medalhista ou ganhar um mundial, sendo que quase nunca se ouve que é ser campeão brasileiro.

Não estou dizendo que devemos virar as costas para o mundial ou algo assim, muito pelo contrário. Não sou hipócrita e me encaixo em tudo isso que citei: meu sonho é ser campeão mundial e é provável que por isso eu não tenha cavalo para disputar o título brasileiro este ano. No entanto, acredito que o esporte no Brasil é maior do que o Campeonato Mundial. Temos ótimos cavalos – e criações muito competentes – cavaleiros empenhados e provas bem organizadas e competitivas. Enfim, somos grandes! Apesar disso, ninguém parece se contentar em ser campeão brasileiro ou ganhar provas aqui, como se o que se passasse dentro do país não contasse ou não fossem “bom o suficiente”.

Acredito que ambições internacionais são muito boas: nos fazem procurar evoluir e nos motivam a nos empenhar cada vez mais, porém não podemos desprezar aquilo que temos e, muito menos, organizar todo o esporte pensando no Mundial. Este é uma prova que acontece a cada dois anos num local e em condições escolhidas pela FEI, onde o Brasil não tem qualquer influência (até hoje pelo menos). Só podemos participar com 6 conjuntos – sem direito a cavalos reserva – e temos que viajar para correr.

Ou seja, o que vem acontecendo não tem muito sentido: organizamos todo o calendário pensando no Mundial; escolhemos, então, 6 conjuntos que viajam até o lugar da prova; aí, normalmente, já perdemos um cavalo que sentiu a viagem e não correrá em 100% de condições; se corrermos para ganhar, 2 ou 3 terminarão a prova; caso 3 completem, há uma chance de ganhar uma medalha por equipe (se estes tiverem entre os 4 escolhidos para a equipe e atingirem colocações suficientes para estar entre as 3 primeiras equipes); fora isso temos que torcer para algum cavalo estar muitíssimo bem no dia e ter uma dose de sorte, para disputar uma medalha individualmente. No final das contas, todo o esporte, durante 2 anos, se voltou para uma chance mínima de medalha no Campeonato Mundial.

Claro que todo o processo de seleção e escolha da equipe faz parte do esporte e o ajuda a crescer, mas me parece que seria muito mais benéfico ouvir de todos “Tentarei ser campeão brasileiro” do que “Só vou completar o Brasileiro para me qualificar para o Mundial”. O enduro brasileiro é mais do que uma prova.

14 de abril de 2008

Haras Endurance 2008

Esporte está muito ligado à tradição. No enduro não é diferente: todos se lembram dos cavalos, rivalidades e provas históricas. Hoje, existem duas provas marcantes do ano: Campeonato Brasileiro e Haras Endurance. A primeira é importante pelo nome e pelo que significa ganhá-la: ser o melhor conjunto do país naquele ano. A segunda chegou a um status parecido devido à repetição da prova no mesmo local e data por 8 anos consecutivos. Hoje todos se lembram do que aconteceu nos campeonatos brasileiros, e como foi cada Haras Endurance.
O que podemos esperar da edição 2008? Por um lado um pouco menos de competitividade nos 160kms (ainda mais se compararmos com a prova do ano passado, a mais competitiva de todas as edições), já que muita gente precisa completar uma prova para se qualificar para a Malásia. Por outro, contato com gente importante do Uruguai (família Olascoaga e Juan Sosa, por exemplo) e Argentina (família Pavlovski), que junto com o Brasil configuram o enduro na América do Sul. Há a possibilidade, ainda, de vir gente do Emirados Árabes. Tudo isso reforça a sensação que eu tenho que a cada ano o enduro torna-se um esporte mais global: hoje estamos muito mais próximos de Uruguai e Argentina e temos verdadeiros relacionamentos com a Europa e Emirados Árabes.
Na trilha não há muitas novidades: haverá morros, como sempre, e partes planas, como a volta no lago, por exemplo. O clima deverá ser próximo ao dos anos anteriores: partes quentes durante o dia, sem nada que maltrate demais os cavalos ou que impeça velocidades altas, junto com partes um pouco mais amenas.
Por fim teremos o já tradicional leilão, que reforça a parte comercial do enduro, aspecto muito menos desenvolvido em nosso país do que em outros. É interessante mesmo para aqueles que não têm interesse em comprar cavalos, já que saber o que se passa no comércio é sempre importante.

31 de março de 2008

Um início animador

Neste sábado realizou-se em Bragança Paulista o Night Riders. A prova, que desde sua primeira edição marca o início do ano endurista, sempre foi muito agradável e divertida: já houve premiação na Tal da Pizza, leilão de números para o campeonato paulista, gincanas, etc. Este ano a novidade era a junção dos dois regulamentos de regularidade (batimento e placas), que tanta discussão geraram. Quanto a isso, parece que o esquema de fato funcionou: aqueles que quiseram fazer um, fizeram, quem quis fazer os dois, fez, e ninguém foi atrapalhado pelo outro (pelo contrário: os que treinam cavalos eram passados e passavam os que faziam o outro regulamento e com isso iam acostumando o cavalo a esse tipo de coisa).

O destaque da prova foi o número de inscrições: ao redor de 150 conjuntos no total. Estavam presentes muitos dos enduristas experientes, aqueles que sempre estão nas provas de regularidade e muita gente nova. Foi animador ver nas trilhas cavaleiros conversando de onde eram, como começaram a montar, da onde conheceram o esporte e todas aquelas coisas que se conversa no meio da prova quando se encontra alguém que nunca se viu antes.
No final, a prova atendeu a todos os públicos: quem queria fazer o esporte pela primeira vez encontrou todas as condições necessárias, quem gosta de regularidade pôde competir com seu cavalo - de qualquer raça, como o Apalosa que ganhou uma categoria - e quem queria treinar também não encontrou problemas, inclusive a noite, o que pode ser uma experiência muito útil no futuro.


Pontos a serem melhorados:

O principal ponto a ser melhorado com certeza é a premiação. Mesmo com toda a demora da apresentação de cavalos do leilão de Abril e brincadeira do ovo na colher, os resultados demoraram a ficarem prontos. Assim, a premiação estava vazia (tendo em vista o número de cavaleiros inscritos) e sem os iniciantes: ou seja, aqueles que deviam sair com um troféu para voltarem na próxima oportunidade não estavam lá.

Outro aspecto que precisa ser revisto é a quantidade de placas. Por serem poucas, os enduristas foram "obrigados" a fazer trechos demasiadamente grandes na mesma velocidade (havia um de mais de meia hora a 9kms/h), tornando a prova numa competição de paciência em alguns pontos, pelo menos para aqueles que fazem a prova para treinar.


Mensagem final:

O Night Riders foi um ótimo treino para cavaleiros, cavalos, veterinários e apoios, deixando uma ótima perspectiva para 2008, devido ao alto número de inscritos.

17 de março de 2008

Estratégias de prova

16; 18,5; 18,5; e 24 kilometros por hora. Tipicamente, essa é uma prova francesa de 120kms. Colocada num gráfico fica empolgante: começa-se devagar, poupando e respeitando o organismo do animal, aumenta-se a velocidade e no último anel corre-se tudo que se pode. Ao ver o gráfico, que termina para frente e para cima, parece que um cavalo foi feito para fazer isso. E quem o vê cruzando a linha, relinchando e com as duas orelhas para frente tem certeza disso.

Sempre me perguntei por que no Brasil não observávamos a mesma estratégia – ou não em todas as provas, como na França. Inicialmente pensei no clima (que é constante lá e muda durante o dia aqui), em uma possível “falta de cultura tática” de nossa parte, em uma maior valorização de vitórias por lá, numa diferença no temperamento dos cavalos, em uma diferença no número de competidores e outros fatores difíceis de checar.

Aí fomos para Campo de Mayo. Tínhamos bons cavalos, o clima era fresco e a topografia parecida com algumas provas francesas. Nossos conjuntos implementaram a “estratégia francesa”, nossos cavalos estavam bem, não tivemos nenhum imprevisto grave e, mesmo assim, perdemos para um cavalo que correu o tempo todo na frente. O anel mais rápido do campeão mundial não foi o último, e sim o 3º (o anel do meio, já que havia 5). O último anel do vice-campeão foi apenas o 4º mais rápido de sua estratégia. Naquele dia, mesmo ponderando o peso da viagem dos nossos cavalos, eu tive que admitir que existe uma “estratégia uruguaia” que também funciona.

Diferenças para explicar cada uma destas estratégias existem. A mais comum é a condição natural de cada lugar (solo, clima, topografia, etc). Mas isso não explica tudo: Saintes Maries de La Mer, por exemplo, é uma prova francesa muito mais parecida com uma prova uruguaia do que com outras provas francesas, no entanto é corrida à francesa. Eu especularia um fator cultural: me parece que os franceses fazem uma prova crescente porque todos os franceses montam assim e os uruguaios estão sempre na ponta porque todos os uruguaios correm sempre na ponta. Não deixa de ser curioso que nenhum uruguaio ganhe com uma estratégia francesa e nenhum francês ganhe com uma estratégia uruguaia, mas até hoje é isso que vem ocorrendo.

O que aconteceria num campeonato mundial em condições neutras eu realmente não sei, mas adoraria ver.

Outras considerações (reflexões que gostaria de fazer mas não se encaixaram no texto)

  • Existe também uma “estratégia árabe”, que consiste basicamente em correr o tempo todo na ponta, a aproximadamente 25kms/h e ver se o cavalo agüenta.
  • Alguém poderia dizer que esta última não funciona, porque de 100 cavalos que largam apenas 30 completam. No Uruguai, no entanto, também há muitas eliminações e na França, de 10 cavalos que largam para o último anel “eletrizante” apenas 2 ou 3 o conseguem fazer, os demais se cansam, têm que se contentar em completar e não aparecem como “grandes estrategistas”.
  • No 120kms, acredito que Brasil e Uruguai estejam no mesmo nível da Europa.

3 de março de 2008

O que é a President’s Cup

Como endurista, sempre quis conhecer a President’s Cup. Muitos dizem que, hoje, é a prova mais importante do mundo. Para mim, dizer simplesmente que é a President’s Cup significa muito mais do que ser “a mais isso” ou “a mais aquilo”, assim como Compiègne é Compiègne, o Campeonato Brasileiro é o Campeonato Brasileiro e o Mundial é o Mundial.

No pré-vet, sexta à tarde, já se sente o peso que a prova tem em todo o mundo. Encontra-se muita gente muito importante no enduro, como Becky Hart (campeã mundal em 1988, 1990 e 1992), Virginie Atger (vice campeã mundial em 2006), Juma Puntí (4º colocado em Aachen e 2º no Europeu), Cécile Miletto (vice campeã mundial em 2000), Pio Olascoaga (campeão de Compiègne 2007), além de todos os cavaleiros árabes e treinadores dos Sheikhs e os veterinários e juízes que sempre estão nos mundiais.

No total são 87 inscrições (na única categoria da prova), muitas decididas em cima da hora, já que o filho de um amigo de um Sheikh pode decidir no último momento montar ou não. São relativamente poucas inscrições, se o número for comparado ao das outras provas da temporada (de 120kms). Os cavalos são conhecidos pelos outros treinadores, seja por seu valor, por resultados passados ou pela expectativa de que o cavalo possa fazer algo positivo. Um dos animais mais comentados era RO Acuarela – irmã de RO Fabiola – égua considerada muito boa mas extremamente difícil de ser montada. Só se soube que ela seria montada e quem a montaria depois do pré-vet.

Os animais então são numerados (os Sheikhs e demais VIPs – como o rei malaio – recebem números especiais) e os cavalos cujas cocheiras se localizam perto do local da prova dormem em suas casas (ao contrário do que acontece nas rígidas provas FEI do Brasil), enquanto os outros têm cocheiras próximas ao parque.

Às 6:07 da manhã é dada a largada na impressionante estrutura de Abu Dhabi. Durante os 34kms do primeiro anel vão se formando grupos de cavalos. O primeiro grupo termina a primeira etapa em 1:20 e os cavalos entram no vet entre 1 e 2 minutos. São 25,2kms/h. Assim que chegam à linha de trote, o veterinário encosta um sensor de Polar nos cavalos, mostra-se, então, numa grande tela qual é o batimento do cavalo. Caso, em 1 minuto, este não fique 15 segundos seguidos abaixo de 64 pulsações, o cavalo tem que sair, recuperar-se e entrar de novo. Logo na saída do vet já está disponível o resultado até aquele momento, em folhas impressas e com as quais todos os cavaleiros ficam analisando sua posição em relação aos demais. Estas duas tecnologias – a tela do Polar e os resultados “ao vivo” – são as coisas mais interessantes que já vi no enduro, tanto para tornar as provas mais competitivas como para dar seriedade a elas. Em terceiro lugar vem o colar francês.

Depois de 30mins larga-se para o segundo anel. Como já faz calor (cerca de 30⁰C e baixa humidade), agora a assistência oferece água para que os cavaleiros molhem os cavalos o tempo todo. São 2 carros por conjunto, alternando-se na assistência, de modo que o cavalo nunca fique seco. Há apenas alguns kilometros – dentro de um parque – no qual não é permitido dar garrafas de água. Fora isso, a única coisa proibida é molhar os cavalos ou dar garrafas de dentro do carro. A ponta completa esta etapa de 32kms em 24,4kms/h. Ao final desta já são 19 eliminados, sendo um deles Acuarela, que derrubou Sheikh Rashid no 1º anel e o completou desmontada.

A terceira etapa – de 30kms – é corrida um pouco mais devagar: 23,8kms/h. O primeiro a entrar no vet é Jibbah Enog, cavalo que ganhou algumas provas na última temporada, em 1 minuto e 22 segundos depois de chegar. Muitas são as teorias para explicar porque os cavalos entram tão rápido. Alguns acreditam que é pela água disponível que evita que os cavalos se aqueçam demais, outros acham que o ritmo constante em que o coração trabalha ajuda a diminuir o tempo de recuperação. O que eu notei é que o modo como o vet-check é montado (uma linha reta entre a chegada e a entrada do vet, na qual os cavalos são molhados) ajuda também. O fato é que, até aqui, muitos nem checam o coração dos cavalos antes de entrar.

O 4º anel, de 24kms, é o mais esperado. Nele é que fica o famoso Tora-Bora, ou “sobe-desce” em árabe. Não é nada muito assustador para quem monta no Brasil, mas para cavalos que montam o tempo todo no plano e já fizeram 96kms a 24kms/h é bastante duro. Trata-se de aproximadamente 5kms de curtas e relativamente íngrimes subidas e descidas seguidas . A assistência corre como em nenhum outro lugar na prova e há dezenas de carros e pessoas se cruzando com garrafas de água para todo lado. No final do anel, Jibbah Enog continua em primeiro ao completar o anel a 21kms/h e entrar em 1 minuto e 51 segundos. Em segundo lugar entra Sheikh Hamdan, filho do Sheikh Mohammed, 7 segundos atrás.

O penúltimo anel também tem 24kms. Com a aproximação do fim da prova é muito importante estar na ponta. Esta, agora, se restringe a 4 cavalos. No vet, depois de fazer o anel em 1 hora, os cavalos demoram 5 minutos para entrar no vet – tempo relativamente longo se pensarmos nos outros anéis. Jibbah Enog demora 10 minutos e deixa a ponta para Ali Khalfan, cavaleiro conhecido e vitorioso nos Emirados, Mohammed e Sheikh Hamdan, estes dois últimos montando cavalos de Sheikh Mohammed.

O último anel é mais curto, são 16kms. Ali Khalfan e Mohammed disputam a liderança por todo o anel, enquanto Sheikh Hamdan fica um pouco para trás. Alguns kilometros antes da chegada, o cavalo de Ali Khalfan se lesiona e começa a mancar, o que o faz parar e ir puxando o animal até o vet. Mohammed espera pelo Sheikh na longa linha de chegada, deixa-o passar e cruza a linha logo em seguida. Assim, Shiekh Hamdan e Kaysand Farrazah – PSA de 1996 – vencem os 160kms a 23,27kms/h.

Assim que o 3º colocado passa no vet-check final é feita a premiação. Uma cerimônia de 5 minutos na qual cada um recebe seu troféu e algum prêmio (como, por exemplo, um carro). Mais tarde é realizado o Best-Condition, de modo semelhante como é feito no Brasil. No final são 22 classificados, sendo um deles o rei da Malásia, que agora conta com a qualificação FEI para correr o mundial em seu país.

E assim é a President’s Cup: uma grande competição, em ritmo alucinante, onde 10 segundos fazem grande diferença e da qual os Sheikhs são as principais estrelas.

20 de fevereiro de 2008

Uma visita interessante

Ninguém pode negar que de alguns anos pra cá os resultados brasileiros têm ficado cada vez mais em evidência no exterior.

Foram diversos os bons resultados em Campeonatos Mundiais e Panamericanos, em Campeonatos Nacionais de países tradicionais ou apenas em provas importantes do calendário internacional.

Tivemos cavaleiros e amazonas "brazucas" realizando conquistas em terras estrangeiras.
Cavalos e éguas sendo exportados, que com suor deixam nosso país cada dia mais à vista.
Equipes que souberam jogar em conjunto e até medalhas trouxeram.

Mas frente aos bons resultados se torna cada vez mais difícil a evolução, pois com eles vêm a crítica e a pressão da repetição.

Para evoluirmos, uma das fórmulas é o novo contato, a experiência de pontos de vista diferentes, mas sempre separando o joio do trigo.

Aos interessados, haverá em breve uma visita que mostrará novos e (diga-se de passagem) qualificados pontos de vista.

Trata-se da visita de Jean-Michel Grimal ao Brasil.

Cavaleiro, treinador e ferrador dos cavalos da cocheira de Jack Begaud (responsável pelos cavalos do Sheikh Maktoum na França), Jean-Michel tem em seu currículo:

- 3o lugar em Montcuq 2004 (200km - 109 participantes)
- 1o lugar em Le Vigan 2004 (160km - 36 participantes)
- 3o lugar em Compiegne 2005 (Mundial de Cavalos Novos 120km - 93 participantes)
- 1o lugar em Santa Suzana 2005 (194km - 106 participantes)
- 1o lugar em Rambouillet 2005 (140km - 70 participantes)
- 2o lugar em Huelgoat 2007 (119km - 58 participantes)

Para visualizar todos seus resultados visite:

http://www.endurance-pedigrees.com/FicheCavalier.aspx?Code=1205

Em sua estadia no Brasil Jean-Michel passará por 3 estados onde realizará palestras sobre enduro e cursos para ferradores.

Veja abaixo a programação:

  • 7/3 e 8/3 - Belo Horizonte
  • 13/3 - Brasília
  • 14/3 e 15/3 - Jaguariúna

Não perca a oportunidade de conhecer o trabalho de um profissional completo!

9 de fevereiro de 2008

Algumas estatísticas de 2007

No início do ano passado publiquei alguns dados que coletei e processei enquanto escrevia parte de um capítulo para o livro “O Enduro Eqüestre”. Estes diziam respeito à velocidade das provas, faturamento, número de provas, inscrições e à genética dos cavalos entre 2000 e 2006, olhando somente para as provas de longa distância (120kms ou mais). Passado um ano, atualizo esses dados e apresento o que ocorreu em 2007.

Número de provas e inscrições:
2007 teve 19 provas de longa distância, distribuídas em 9 eventos (num evento como, por exemplo, o Campeonato Brasileiro, houve duas provas: 120kms adultos e 120kms young riders), exatamente o mesmo número de 2006 (até então o recorde desde 2000). O Panamericano e o Campeonato Brasileiro foram considerados dois eventos independentes. A boa notícia é que o número de inscritos aumentou, de 224 para 261 (em torno de 16,5%), o que caracteriza o ano que passou como o com o maior número de inscritos em provas de longa distância desde 2000. A média de inscritos por prova e por evento também foi alta, a 3ª e a 2ª maiores, respectivamente, desde 2000.
O maior evento foi o campeonato Panamericano com 48 inscrições, seguido do Brasileiro com 45 e do Haras Endurance International, com 38. Se considerássemos o Panamericano e o Brasileiro como um só evento, este passaria a III Corrida dos Campeões, maior evento desde 2000 com 81 inscrições. Em relação às provas, a categoria adulto destes três eventos (Pan, Brasileiro e Haras Endurance) contou com 27 inscritos cada uma, sendo as maiores provas do ano.

Velocidade:
2007 bateu o recorde de velocidade em 120kms. A prova de young riders do Panamericano foi corrida a 20,8kms/h. O segundo lugar também aconteceu em 2007 e também no Panamericano: 20,7kms/h na categoria adulto. Até 2006 o recorde era de 19,39kms/h (no Campeonato Brasileiro Young riders de 2006). A média das velocidades vencedoras de 2007 ficou em 17,03kms/h, que supera os 16,54 de 2003, até então o ano mais rápido.
No 160 a prova mais rápida foi a de Avaré, vencida a 16,5kms/h. Em seguida aparece a prova de Brasília, a 16,21 e Campinas a 15,99. Os números ficam distantes do recorde de 2006 (18,32kms/h em Campinas), no entanto não se distanciam do 2º lugar (16,72kms/h em 2004).

Faturamento e preço de inscrição:
O ano de 2007 foi marcado por provas grandes e caras. O preço médio de inscrição subiu de R$ 393,00 (já inflacionado para valores de 2007) para R$ 591,00. Para isso contribuíram o status FEI de todas as provas e o Campeonato Panamericano (cuja inscrição custou US$ 500,00). Assim, 2007 bateu 2002 no preço médio da inscrição (R$ 418,00 em 2002, em valores atuais).
Como nos anos anteriores, provas mais caras contaram com mais inscrições. Sendo assim, o faturamento total do ano bateu o recorde de 2006 (R$ 165.120,00 contra R$ 95.500,00).
O maior evento foi o Panamericano (R$ 48.000,00 – maior valor desde 2000) seguido do Campeonato Brasileiro (R$ 25.200 – 5º maior faturamento desde 2000).

Pedigree:
Para o rankeamento de pais e garanhões as provas do Panamericano foram pontuadas como as do Campeonato Brasileiro, privilegiando-as em relação às outras provas. Para uma explicação mais aprofundada sobre o sistema de pontuação, consultar o estudo referente aos anos de 2000-2006.

Ranking de garanhões (todos os garanhões – até a 5ª geração – recebem pontos, privilegiando o pai sobre os avôs, avôs sobre bisavôs, etc) - ano 2007:
Aladdinn – 12192 pontos
Witraz – 10992 pontos
Bask – 9856 pontos
AF Don Giovani – 8992 pontos
Pepi – 8576 pontos

Com essa pontuação, Witraz supera Bask no ranking geral - 2000 a 2007 – em parênteses as posições ganhas ou perdidas em relação a 2006:
Witraz – 45420 pontos (+1 posição)
Bask – 44964 pontos (-1 posição)
Aladdinn – 44612 pontos (estável)
Morafic – 35232 pontos (+ 2 posições)
Nazeer – 34668 pontos (-1 posição)

Ranking de pais (apenas os pais dos cavalos recebem pontos) - ano 2007:
Pepi – 536 pontos
AF Don Giovani – 420 pontos
Polonez – 316 pontos
Ninjah El Jamaal – 288 pontos
Gran Giovani – 284 pontos

Com 2007, Pepi sobe 3 posições e encosta em Polonez - 2000 a 2007:
Polonez – 1620 pontos (estável)
Pepi – 1452 pontos (+3 posições)
Kibrit FA – 1260 pontos (-1 posição)
Ninjah El Jamaal – 1188 pontos (estável)
Almaden II – 1004 pontos (-2 posições)

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